TRF2 inaugura Memorial Pontes de Miranda, homenagem a um dos maiores juristas da história do País

O presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), desembargador federal Guilherme Calmon, inaugurou nesta terça-feira, 18/03, o Memorial Pontes de Miranda, na Seção Judiciária do Rio de Janeiro (SJRJ), no bairro da Saúde, região portuária carioca. O espaço, sob a curadoria do professor e procurador da República Antonio do Passo Cabral, abriga a exposição “A diversidade de uma Mente Singular”, composta por livros, documentos, móveis e material audiovisual. A higienização, catalogação e todo o processamento técnico das peças ocorrem sob a coordenação da equipe do Núcleo de Gestão Documental e Biblioteca do TRF2.  A doação do material foi formalizada por Rafael Almeida de Piro e Francisco Pontes de Miranda Ferreira, inventariantes do espólio de Pontes de Miranda.

O alagoano Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda nasceu em 1892 e morreu em 1979, aos 87 anos, nove meses depois de sua eleição para a Academia Brasileira de Letras. Desde cedo mostrava uma inteligência incomum e aptidão para os estudos. Aos sete anos lia em português e francês. Já no segundo ano da faculdade, escreveu, à mão, seu primeiro livro, “À Margem do Direito”, ganhando elogios de Ruy Barbosa, o maior jurista do país da época. Autor de mais de 300 obras no Brasil e no exterior, Pontes de Miranda foi desembargador do antigo Tribunal de Apelação e embaixador na Colômbia. Influenciado pela Escola alemã, o magistrado introduziu novos métodos e concepções na Teoria Geral do Direito, Filosofia do Direito, Direito Constitucional, Direito Internacional Privado, Direito Civil, Direito Comercial e Direito Processual Civil.

Tentando segurar a emoção, Guilherme Calmon ressaltou as qualidades de Pontes de Miranda. “O professor foi um homem de múltiplos talentos, cuja curiosidade e erudição ultrapassaram os limites do Direito, alcançando a filosofia, a literatura, a física e até a marcenaria. Essa busca pelo saber fez dele uma figura singular, um pensador que transcendia a sua época”. O presidente do TRF2 lembrou a maior empreitada do jurista, “que foi escrever o Tratado de Direito Privado. Voltado para o Direito Civil, bebi na fonte de Pontes de Miranda. Este tratado é um marco da nossa ciência jurídica”. Calmon contou que o homenageado trocou correspondências com Albert Einstein sobre a teoria da relatividade. “A pedido de Einstein, escreveu em alemão uma tese sobre a representação do espaço, publicada no Congresso Internacional de Filosofia de Nápoles em 1924”.  O magistrado destacou ainda a defesa intransigente do jurista pela Democracia. “Pontes de Miranda colocava os valores ideais democráticos acima de interesses pessoais. Quase ninguém sabe, mas ele recusou convite para chefiar a embaixada do Brasil na Alemanha no período nazista, exatamente por ser radicalmente contra qualquer tipo de regime ditatorial”.

A 20 dias de deixar a direção do Foro da SJRJ, o juiz federal Eduardo André Fernandes se recordou de uma conversa com Guilherme Calmon no início de sua gestão, quando falaram sobre o esvaziamento dos prédios públicos nos últimos anos. “Conseguimos transformar nossas dependências também em espaços culturais. É uma honra darmos um novo sentido aos prédios da Justiça, que hoje estão muito mais vazios. Conseguimos identificar a necessidade de oferecer cultura. Já que os prédios não têm gente, a cultura pode atrair o povo para cá”.  

Muito emocionado com a homenagem ao avô, Rafael de Piro citou um trecho de “Prelúdio”, música de Raul Seixas. “Sonho que se sonha só/ É só um sonho/Sonho que se sonha junto/É realidade. Esse sonho começou em 2009, quando meu pai, junto com o doutor Paulo Barata, tiveram a iniciativa de doar parte da obra do professor e jurista. Recorremos ao amigo Theophilo Miguel, na época integrante da Comissão de Preservação e da Memória Institucional, fundamental para o projeto se tornar realidade”. O neto ressaltou como Pontes de Miranda era um homem visionário, à frente de seu tempo. “Aos 23 anos, escreveu ‘História e Prática do Habeas Corpus’. Em 1940, publicou um livro sobre Democracia, liberdade e igualdade, onde defendia que, sem Democracia e liberdade não poderia haver igualdade. De Piro lembrou ainda da mulher do jurista. “Minha avó trazia realidade aos seus sonhos, aos seus pensamentos, às suas vontades. Sabemos que ao lado de um gênio é importante alguém que tenha contato com a realidade para que as coisas aconteçam”, destacou. Já Francisco Pontes de Miranda Ferreira, outro neto, lembrou com muito carinho da convivência com o avô, “que mandava um motorista de taxi me buscar em Copacabana toda terça-feira para jantar com ele no Hippopotamus, em Ipanema”. Mestre em Sociologia e Antropologia, Francisco se surpreendeu coma versatilidade do avô. “Só recentemente descobri que ele entendia também dessas ciências. Pontes de Miranda era multidisciplinar”.

Curador do memorial, Antonio do Passo Cabral também ressaltou a versatilidade de Pontes de Miranda. “Era sociólogo,  matemático, físico, biólogo, antropólogo, psicólogo, um verdadeiro cientista. É isso que vemos aqui. Além de ter sido desembargador no Rio de Janeiro, na época do Distrito Federal. Trazer esse memorial para uma Casa de Justiça é também recuperar um lado que muitos não conhecem, o Pontes de Miranda magistrado”.

Participaram ainda da inauguração do memorial os desembargadores federais Ferreira Neves, presidente da Comissão de Gestão de Memória do TRF2; Theophilo Miguel, vice-diretor do Centro Cultural Justiça Federal e Alfredo Hilário; o desembargador federal aposentado Raudênio Bonifácio; os juízes auxiliares da Presidência, Paula Provedel e Alfredo Jara Moura; o vice-diretor do Foro da SJRJ, juiz federal Silvio Wanderley; o juiz federal Roberto Schuman; a juíza federal Marceli Siqueira, presidente da Associação dos Juízes Federais do Rio de Janeiro e Espírito Santo (AJUFERJES); o vice-presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, desembargador Leonardo Pacheco; o juiz auxiliar Marcelo Oliveira da Silva, representando o corregedor-geral do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), desembargador Claudio Brandão de Oliveira; o desembargador aposentado do TJRJ, Sergio Cavalieri Filho, além de familiares do professor Pontes de Miranda, juízes, procuradores, representantes da OAB, servidores da Justiça Federal e convidados.