Às vésperas do Carnaval, Tribunais de Justiça lançam campanha contra o trabalho infantil. Crimes como esse aumentam 38% nos dias de folia

Mais de 350 pessoas, entre ministros, desembargadores, juízes, procuradores, promotores, defensores públicos, advogados, servidores e jovens aprendizes, lotaram o auditório do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT1), no centro do Rio de Janeiro, para um ato organizado pelo Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem. Junto a outras instituições como o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), a Defensoria Pública da União (DPU), o Ministério Público do Trabalho (MPT), a Secretaria Municipal de Assistência Social do Rio de Janeiro e o Centro de Integração Empresa Escola, o TRT1 lançou a campanha “Carnaval sem Trabalho Infantil e com Trabalho Seguro”. Com o slogan “Criança protegida, folia garantida”, o movimento quer engajar a sociedade no combate ao trabalho infantil, reduzindo a prática durante a folia, época que, segundo o MPT, as notificações aumentam, em média, 38% em todo o país.

Participaram da mesa de honra o presidente do TRT1, desembargador Roque Lucarelli, que comanda o Programa Nacional de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem; ; o presidente do TRF2, desembargador federal Guilherme Calmon; o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Evandro Pereira Valadão Lopes; o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho, Fabio Goulart Villela; o vice-presidente do TRT1, desembargador Leonardo da Silveira Pacheco, coordenador do Subcomitê de Responsabilidade Socioambiental; a gestora regional do 2º Grau do Programa Nacional de Prevenção a Acidentes de Trabalho, desembargadora Maria Aparecida Coutinho Magalhães;  a secretária municipal de Assistência Social do Rio de Janeiro, Marta Rocha e o superintendente geral do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE),  Luiz Gustavo Coppola.

Marcaram presença no ato a secretária-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Adriana Cruz; o também conselheiro do CNJ, Alexandre Teixeira; o juiz federal Eduardo André Fernandes, diretor do Foro da Seção Judiciária do Rio de Janeiro (SJRJ); a juíza federal Marceli Siqueira, presidente da Associação dos Juízes Federais do Rio de Janeiro e Espírito Santo (Ajuferjes); o juiz federal Alfredo Jara Moura, auxiliar da Presidência do TRF2; a presidente da Ordem dos Advogados do Brasil/Seccional Rio de Janeiro (OAB-RJ), Ana Tereza Basilio; entre outras autoridades.

Em sua fala, Guilherme Calmon destacou que crianças são prioridade em qualquer sociedade. “Não há como se reconhecer uma Democracia sem a efetiva proteção às crianças”. O magistrado lembrou do artigo 227 da Constituição, que prevê um rol de direitos fundamentais da criança, do adolescente e do jovem. Do outro lado há como devedores a família, a sociedade e o Estado. Fiz um levantamento muito rápido a partir de dados divulgados pelo IBGE. Em 2023, mais de um milhão e 600 mil crianças e adolescentes, entre 5 e 17 anos, foram identificadas em situação de trabalho infantil no Brasil”, informou. O magistrado chamou a atenção para um drama dos tempos atuais. “Temos cada vez mais observado diferentes formas de exploração do trabalho infantil, algumas delas de difícil apuração e de comprovação. E até de vários ilícitos, não apenas no mundo físico, mas também no mundo virtual. Hoje há abuso de crianças e adolescentes no mundo digital. Temos que estar atentos a isso”, alertou, lembrando da importância das parcerias. “Se não for através de um trabalho em cooperação, se cada um fizer apenas a atividade de seu quadrado. não chegaremos a lugar nenhum”.

A exemplo de Calmon, o ministro do TST, Evandro Pereira Valadão Lopes, também saudou a rede que se formou. “Como é salutar essa interação entre instituições, que estão dispostas a trabalhar nessa rede pela erradicação do trabalho infantil”, disse, com alegria. O ministro contou para a plateia sobre uma discussão, em encontro que reuniu juízes de Língua Portuguesa em Angola. “Depois de apresentar um programa de combate ao trabalho infantil, uma juíza da Corte Constitucional de Angola, de certa forma agressiva, me perguntou:  o que o Poder Judiciário tem a ver com isso? Respondi: tudo! Nós aplicamos a lei. O trabalho infantil é uma infâmia, uma tragédia. Se apenas uma criança estivesse trabalhando em condições perigosas, insalubres, com risco de vida, que fosse lhe roubado um futuro, isso já seria trágico. Mas estamos falando um milhão 600 mil crianças, entre elas 700 mil nas piores condições. Existem pessoas que não sabem que crianças trabalham. Quantas vezes encontramos menores nos sinais vendendo bala, simplesmente aceleramos o nosso carro e vamos embora? Acontece todos os dias.. Isso é trabalho degradante. Essa tragédia não pode continuar invisível”, alertou o ministro.

Depois de agradecer ao colega de toga José Luis Xavier, gestor desde 2017 do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem do TRT1, o anfitrião do ato, desembargador Roque Lucarelli, foi direto. “Precisamos ter uma coisa em mente. Trabalho infantil é proibido por lei. Ponto. Trabalho infantil é proibido por lei preceito de ordem pública. Trabalho de adolescente a partir de 14 anos é permitido, mas por meio de aprendizagem. É um caminho muito fértil para oportunidades profissionais. Nós do Judiciário, o Ministério Público, a OAB, as entidades da sociedade civil, o poder executivo municipal, podemos mudar alguma coisa nesta, no nosso país”, destacou. “Espero que os adolescentes que vieram aqui saiam com um pouco de esperança depois desse ato”, encerrou.

Depois da fala do Lucarelli, a juíza federal Giovana Brantes Calmon, a juíza do TRT1, Joana Duha Guerreiro e a juíza do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), Claudia Motta, leram um manifesto de repúdio veemente ao trabalho infantil e a exploração de crianças e adolescentes. Assinam o documento o Fórum do Poder Judiciário do Rio de Janeiro, que reúne as quatro casas da Justiça fluminense, o Ministério Público Federal, o Ministério Público Estadual , o Ministério Público do Trabalho, a Defensoria Pública da União do Estado do Rio de Janeiro, o Governo do Rio de Janeiro, a Prefeitura do Rio de Janeiro, incluindo a Secretaria Municipal de Assistência Social, a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, além de instituições civis, cidadãs e cidadãos.